Quando nos colocamos a desenhar um exercício para a nossa equipa que indicadores utilizamos para dar por concluída a tarefa? Quanto dessa decisão vem de um feeling que não conseguimos traduzir em palavras e quanto vem de parâmetros que temos sempre em conta, mensuráveis e visíveis, em todas as unidades de treino?

Sim, estou a assumir que todos os treinadores chegam aos seus exercícios por um misto de feeling e de regras que os orientam sempre, numa proporção pouco importante. O importante para mim, e que motiva este artigo, é a tese de que só temos a ganhar em saber quais são características mais decisivas na construção de um bom exercício. Por três razões principais:

  1. Cada vez mais são os treinadores que partilham as suas ideias e o seu processo de construção de exercícios e por isso podemos, e devemos, refletir sobre que aspetos valorizam e enquadrar o que mais apreciamos no nosso processo.
  2. Quando há um lado tácito, fruto da experiência e que não se explica, a alimentar os nossos exercícios vale a pena investigar o que está por detrás das nossas ideias e perceber se são tendências e preconceitos que são valiosos ou se nos estão a cegar para o que é melhor para a nossa equipa.
  3. Ter especial atenção com aquilo que "sempre fizemos assim", já que muito provavelmente será aí que está o que de melhor fazemos no treino ou o pior! Dificilmente há meio termo entre os grandes benefícios de apostar numa fórmula vencedora ou os grandes prejuízos do organismo que não se adapta e não evolui.

Foi pensar nisto que me fez debruçar sobre quais seriam as características que mais qualidade dão um exercício de futebol.

Um bom exercício de futebol é simples

"É teres exercícios simples, que te permitem jogar a um nível elevado, o que é difícil, porque pôr os jogadores a pensar em demasiado sobre as regras do exercício significa que enquanto estás a pensar em regras limitas o teu futebol." - Carlos Carvalhal

As condicionantes, regras e sinalizadores de um exercício tem de significar o menor esforço mental possível para serem interpretados pelos jogadores. A carga, do(s) tipo(s) que estiverem a trabalhar, tem de vir do executar do exercício e não de pensar no que se pode fazer nele.

O exercício até pode ter um peso tático brutal, provocador de situações difíceis de interpretar, resolver, ou coordenar, mas que nunca seja por colocar a pensar os jogadores em regras e instruções que ouviram há 2 minutos e que por vezes até os próprios elementos da equipa técnica confundem na preparação do treino.

Aqui o critério é simplificar para a nossa equipa, usando o número de regras suficientes (nem poucas, nem muitas) para que os nossos jogadores cheguem aos comportamentos que propomos. O exercício que hoje tem a complexidade ideal pode ser um exercício a que faltam regras depois de o fazermos durantes duas semanas.

Este 8x8+3 apareceu no primeiro treino de Julian Nagelsmann no FC Bayern. Olhando a estrutura e a como o imaginam a funcionar, de 0 a 10 como avaliam a simplicidade deste exercício comparado com os que entram mais vezes no vosso treino? E comparado com os que entram no vosso primeiro treino da época? Tiram mais conclusões do que é treinar um gigante europeu ou do que prioritiza o treinado alemão?
Este 8x8+3 apareceu no primeiro treino de Julian Nagelsmann no FC Bayern. Olhando a estrutura e a como o imaginam a funcionar, de 0 a 10 como avaliam a simplicidade deste exercício comparado com os que entram mais vezes no vosso treino? E comparado com os que entram no vosso primeiro treino da época? Tiram mais conclusões do que é treinar um gigante europeu ou do que prioritiza o treinado alemão?

Em caso de dúvida é preferível simplificar a mais do que a menos porque o ajuste representa um subir de escalão para os jogadores, um progresso. Se for ao contrário, a mensagem que podemos correr o risco de passar é que os jogadores não estão à altura da dificuldade do exercício.

Quando idealizei esta proposta de exercício no SC Esmoriz não era com a intenção de o operacionalizar com todos os ingredientes possíveis, embora em teoria o pudesse fazer. Tanto pode ser um jogo muito simples com duas equipas a defender duas balizas e atacar outras duas, como pode ter múltiplas formas de pontuar golos, espaços e objetivos para os vários momentos do jogo. Como já devem saber, muito do treino faz-se pelo acerto na dosagem.
Quando idealizei esta proposta de exercício no SC Esmoriz não era com a intenção de o operacionalizar com todos os ingredientes possíveis, embora em teoria o pudesse fazer. Tanto pode ser um jogo muito simples com duas equipas a defender duas balizas e atacar outras duas, como pode ter múltiplas formas de pontuar golos, espaços e objetivos para os vários momentos do jogo. Como já devem saber, muito do treino faz-se pelo acerto na dosagem.

Uma outra dica para acertar na complexidade do exercício passa por reduzir o número de objetivos do mesmo. Muitas vezes por querermos incluir tanto do jogo no mesmo exercício (o que não é nada negativo) somos levados a exigir variados comportamentos dos vários momentos (acompanhados das respetivas regras). Já que está lá o jogo todo porque não? Só que o problema é que o mais importante para nós, e que motivou originalmente a criação do exercício, vai ficar diluído no meio de todos os outros feedbacks e na menor simplicidade que o exercício passou a ter.

Um bom exercício de futebol tem uma intenção

"Quero fazer um treino sobre a organização defensiva, vais lá, tica-tica, clica aqui, clica acolá, e vai-te aparecer. Outra coisa é seres capaz de produzir o teu próprio conhecimento. Ninguém melhor do que nós deve ser capaz de ter uma determinada ideia para um período de tempo e ser capaz de a operacionalizar." - José Mourinho

Quando desenhamos um exercício temos de pensar em mais do que no seu objetivo. Isso é só metade do trabalho. Tão importante como o destino onde queremos que a nossa equipa chegue é reconhecer o ponto em que se encontra e como lá chegou. É a qualidade com que definimos o patamar atual da nossa equipa que vai informar melhor, ou pior, como pretendemos que a nossa equipa dê o passo seguinte na sua evolução.

Vamos dar o benefício da dúvida a todos os treinadores, dos mais experientes aos menos, dos mais românticos aos mais pragmáticos, que quando escolhem um exercício para o seu treino fazem-no com o objetivo de levar a sua equipa evoluir, ao encontro da sua ideia de jogo. Vamos assumir que isso é o standard e que até um exercício que se traz diretamente de uma rede social para o nosso treino cumpre para nós esse objetivo.

A diferença desses exercícios para um bom exercício é, no entanto, a falta de intenção.

Para Marcelo Bielsa há uma maneira melhor de defender tabelas e por isso há que ser treinada. Este exercício pode ser só um 2x1 para qualquer treinador, mas partindo do momento da equipa de Bielsa o 2x1 passa a secundário, o aproveitamento da superioridade numérica também, e todo o foco está em ajudar o defesa a contrariar este recurso tão eficaz para aproveitar a superioridade numérica.
Para Marcelo Bielsa há uma maneira melhor de defender tabelas e por isso há que ser treinada. Este exercício pode ser só um 2x1 para qualquer treinador, mas partindo do momento da equipa de Bielsa o 2x1 passa a secundário, o aproveitamento da superioridade numérica também, e todo o foco está em ajudar o defesa a contrariar este recurso tão eficaz para aproveitar a superioridade numérica. "Roubar" este exercício pode ser fácil, mas levar a nossa equipa a defender bem tabelas vai requer mais arte da nossa parte.

Eu quero partir desde a minha equipa e do que pretendo para ela, para depois criando desde esse contexto, chegar a formas de exercício que domino completamente em todas as dimensões do treino e que servem aos meus jogadores. Sem intenção o processo inverte-se completamente. É pegar no mesmo exercício, vindo de uma "rede social", para depois ir analisar se tenho alguma intenção que se lhe adeque e, em função disso, encaixa-lo no treino ou não. O resultado final parece o mesmo, mas a viagem que fazemos, e o que levamos connosco, é completamente diferente.

É conhecendo, e usando, o momento atual dos nossos jogadores, que podemos adequar o melhor possível o exercício ao contexto que se vive e aos comportamentos em que a nossa equipa mais precisa de evoluir no momento. Por outro lado, é especificando o estado ideal onde queremos que a nossa equipa chegue, que podemos aferir os critérios de êxito do exercício e o grau de sucesso após a condução do mesmo.

Um treinador que tem uma intenção por trás de cada exercício vai explica-lo (de trás para a frente, da frente para trás, ou do meio para fora) e orienta-lo melhor. Mas mais importante, não vai ficar defensivo porque um jogador lhe pergunta o porquê de estarem a fazer aquilo, não vai ter medo de detalhar o porquê daquele ser o melhor dispêndio de energias que aquela equipa pode ultrapassar naquele momento, e vai até encorajar cada questão dos seus jogadores. É o que se espera dos treinadores com intenções.

Um bom exercício de futebol é específico

"Acredito mesmo que se quiseres jogar rápido, então tudo começa na mente e tens de treinar como se fosse o jogo. Faço-o muito com plantel principal. Uma equipa ataca, uma equipa defende. Têm 40 segundos para marcar, se não conseguirem, estão fora." - Pepijn Lijnders

Um bom exercício de futebol é aquele que promove uns comportamentos, e não outros, que montam o jogar pretendido para a minha equipa, e não outro. No limite, um bom exercício para a minha equipa não o pode ser para mais nenhuma, porque mais nenhuma exibe, em detalhe, os elementos do nosso jogar. Não há outra equipa que esteja a fazer a mesma trajetória que a nossa, nem esteja em direção ao mesmo alvo. No fundo, não há outro modelo de jogo como o nosso.

São estes exercícios que dão vida ao nosso modelo de jogo porque são os que vão exacerbar os seus princípios. As questões colocadas por um exercício aos jogadores terão como respostas mais adequadas os comportamentos que queremos que a nossa equipa exiba, em jogo, nas situações equivalentes. Por outro lado, o exercício promover de vez em quando um determinado comportamento, se calhar até por sorte, não é um exercício específico.

Em 2021 todos sabemos alguma coisa de como joga o Atlético de Simeone. 1-4-4-2 de linhas juntas, de muito rigor defensivo e espírito de sacrifício. Um exercício que coloca uma das suas linhas de 4 a procurar ligar com a dupla de pivôs/avançados enquanto tem outra linha de quatro a impedir que isso aconteça com constantes contenções/coberturas/concentração/equilíbrios defensivos parece ser o tipo de exercício que não sairá do menu muitas vezes.
Em 2021 todos sabemos alguma coisa de como joga o Atlético de Simeone. 1-4-4-2 de linhas juntas, de muito rigor defensivo e espírito de sacrifício. Um exercício que coloca uma das suas linhas de 4 a procurar ligar com a dupla de pivôs/avançados enquanto tem outra linha de quatro a impedir que isso aconteça com constantes contenções/coberturas/concentração/equilíbrios defensivos parece ser o tipo de exercício que não sairá do menu muitas vezes.

O exercício precisa de acicatar uma ação-reação pretendida as vezes suficientes para deixar um vinco difícil de tirar e aí sim, é um exercício específico, porque para além dos jogadores viverem o problema, e a solução, que idealizamos também vivem um processo de aprendizagem, domínio e evolução.

Um dos exercícios mais comuns nos treinos a que assisto é alguma variante deste 6x6+6. Os objetivos principais passam habitualmente pela manutenção da posse de bola para criar as condições de ligação e a reação forte à perda da bola. De certeza que há outros objetivos, mas estes são suficientes e estão tão presentes neste exercício que acabam por validar o grande potencial do mesmo. A minha grande dúvida é se todas as equipas que fazem este exercício procuram manter a posse sob pressão em espaços curtos, e se é dessa forma que perdem mais vezes a bola.
Um dos exercícios mais comuns nos treinos a que assisto é alguma variante deste 6x6+6. Os objetivos principais passam habitualmente pela manutenção da posse de bola para criar as condições de ligação e a reação forte à perda da bola. De certeza que há outros objetivos, mas estes são suficientes e estão tão presentes neste exercício que acabam por validar o grande potencial do mesmo. A minha grande dúvida é se todas as equipas que fazem este exercício procuram manter a posse sob pressão em espaços curtos, e se é dessa forma que perdem mais vezes a bola.

A especificidade não se fica, no entanto, por comportamentos e princípios. É também o ritmo a que se sucedem as situações, a agressividade com que se abordam os lances, o tamanho dos espaços disponíveis, as decisões que os jogadores têm de tomar, ou as capacidades condicionais requisitadas que são as mesmas.

Aplica-se aqui uma das metáforas mais deliciosas da Periodização Táctica, que é a da comparação entre os motores de F1 e o diesel comum: se queremos jogar a um ritmo alto (F1), em que a número de decisões corretas, e ações diferentes, é muito alto, então temos de treinar a esse ritmo e interromper os exercícios assim que o nível baixe. Se por outro lado deixarmos exercícios decorrer, em que os jogadores já andam a "diesel", onde já não pressionam com a mesma agressividade, em que já não procuram espaços livres e a desmarcação, então por muitos princípios do nosso modelo de jogo que se repliquem, vamos estar a construir um jogar a "diesel", que não é o que nós pretendíamos inicialmente e que se calhar até nos vai surpreender pela negativa quando aparecer em jogo. Um bom exercício deixa de o ser bem antes de acharmos que o temos de parar.

Um bom exercício de futebol é autossuficiente

"O exercício tem de operacionalizar por si próprio para ter qualidade." - Vítor Pereira

Um bom exercício coloca perguntas aos jogadores e estes darão as melhores respostas ao seu alcance. Estas responsabilidades estão muito bem delineadas. A qualidade da intervenção do treinador mede-se pela qualidade das perguntas que propõe aos seus jogadores, não pelas respostas que lhes dá durante o treino.

Um exercício autossuficiente não dispensa da equipa técnica para o orientar, mas dispensa das suas respostas quanto às melhores ações e comportamentos do jogador para cada problema. O próprio exercício vai esconder, dificultando, comportamentos menos preferidos, e vai promover, recompensando, as ações e dinâmicas que estamos à procura.

Quando tantos treinos se fazem sobre as mesmas linhas é porque têm um papel importante. O jogo de posição proposto por Pep Guardiola tem princípios bem definidos e até, atrevo-me, demarcados. Não duvido que muitas instruções cheguem via feedback, mas há um impacto que não se pode descontar quando se joga num terreno que orienta e dá referências das regras que o treinador pretende sem este intervir: é mais fácil perceber que nos amontoamos, que há espaços que não estão ocupados, que tapo, ou destapo, linhas de passe estando dois passos ao lado.
Quando tantos treinos se fazem sobre as mesmas linhas é porque têm um papel importante. O jogo de posição proposto por Pep Guardiola tem princípios bem definidos e até, atrevo-me, demarcados. Não duvido que muitas instruções cheguem via feedback, mas há um impacto que não se pode descontar quando se joga num terreno que orienta e dá referências das regras que o treinador pretende sem este intervir: é mais fácil perceber que nos amontoamos, que há espaços que não estão ocupados, que tapo, ou destapo, linhas de passe estando dois passos ao lado.

Se os jogadores começam a ter repetidamente insucesso quando procuram dar uma determinada resposta é necessário a nossa atenção para perceber duas coisas:

  • estão a mostrar, ou não, a mesma dificuldade que pretendemos corrigir/evoluir e que era objetivo do exercício;
  • estão a mostrar a necessária inteligência tática para reconhecer o problema e a experimentar diferentes alternativas.

Em relação ao primeiro ponto, um exercício só é autossuficiente se provocar as situações que lhe deram origem, porque são desses pontos de partida que chegamos aos comportamentos que queremos melhorar. No segundo ponto, aqui sim a intervenção chave da equipa técnica em saber ajudar os jogadores a perceber o problema em que estão e a encontrarem as respostas como coletivo (pouco útil se dois jogadores souberem o que se está a passar se o resto da equipa for na direção oposta), sem nunca as dar de forma descarada.

Se precisamos de estar a comandar o exercício de fora é porque os comportamentos que pretendemos não estão a aparecer e o problema está no próprio exercício que não é autossuficiente. Das duas uma: ou as soluções que queremos que os nossos jogadores encontrem para um determinado problema não aparecem como viáveis, ou não são as melhores soluções.

Este exercício foi uma das soluções encontradas por Vítor Pereira para ajudar os seus jogadores a identificarem os espaços vazios no corredor oposto à bola e promover variações do centro de jogo. Os ataques não podem morrer no corredor em que se iniciam por falta de opções. Ao colocar duas balizas extra, uma em cada corredor lateral, está a promover uma concentração mais acentuada de jogadores no corredor da bola, porque encontram aí um alvo, mas também mais espaço no corredor oposto para ser explorado. Não vai ser ele a dar o feedback para haver variação rápida de corredor, mas o exercício está sem dúvida a dar uma grande ajuda na tomada dessa decisão.
Este exercício foi uma das soluções encontradas por Vítor Pereira para ajudar os seus jogadores a identificarem os espaços vazios no corredor oposto à bola e promover variações do centro de jogo. Os ataques não podem morrer no corredor em que se iniciam por falta de opções. Ao colocar duas balizas extra, uma em cada corredor lateral, está a promover uma concentração mais acentuada de jogadores no corredor da bola, porque encontram aí um alvo, mas também mais espaço no corredor oposto para ser explorado. Não vai ser ele a dar o feedback para haver variação rápida de corredor, mas o exercício está sem dúvida a dar uma grande ajuda na tomada dessa decisão.

Criar um exercício que não viva sem o feedback do treinador é caminhar no sentido de ter que fornecer soluções aos jogadores e o risco que isso acarreta: o risco dos jogadores depois só verem aquela solução porque querem agradar ao técnico, mesmo havendo outra opções melhores, e mais óbvias, disponíveis. E pior, corremos o risco de eliminar o incentivo para eles descobrirem as suas próprias soluções (não raras vezes melhores que as nossas).

Um bom exercício de futebol é competitivo

"Todos os exercícios do nosso treino são a competir. É sempre estes contra aqueles. Quem está a ganhar este exercício? Quem vai ganhar o treino?" - Rui Quinta

O futebol, bem lá no fundo, é um jogo. Um jogo em que competem duas equipas para só uma poder ganhar. Esta é a essência que muitas vezes damos por adquirida no treino e, entre tanta preocupação com o não desvirtuar da "essência" do jogo acabamos por abdicar daquela que é mais primitiva.

Que não seja apenas ao fim de semana que os nossos jogadores encontrem algo com significado por que lutar.

A recompensa é inegável para quem ganha e terrível para quem perde. Tuchel soube como transformar completamente a dinâmica de um treino mesmo tendo jogadores que ganharam uma Champions um par de meses antes e podiam estar pouco importados com um simples exercício. Talvez passe mesmo por aí um dos segredos do impacto do treinador alemão: por mais pequeno que seja o contexto, só vale a pena se estiver ali uma Champions em jogo.
A recompensa é inegável para quem ganha e terrível para quem perde. Tuchel soube como transformar completamente a dinâmica de um treino mesmo tendo jogadores que ganharam uma Champions um par de meses antes e podiam estar pouco importados com um simples exercício. Talvez passe mesmo por aí um dos segredos do impacto do treinador alemão: por mais pequeno que seja o contexto, só vale a pena se estiver ali uma Champions em jogo.

Por muitos jogos que se façam, e resultados que se marquem, ao longo do treino, se isso for igual para quem ganha e quem perde, então estamos perante uma diferença considerável para o que os jogadores vão encontrar no jogo seguinte. Todos sabemos que nunca vai ser igual disputar um GR+6x6+GR ou uma partida do campeonato, mas não é por ser no treino que temos permissão para não pensar em diferentes consequências para cada desempenho. Consequências não significa castigar, mas sim desenhar "horizontes" onde os jogadores se possam imaginar caso ganhem, ou caso percam, e os levem a decidir, correr e executar com tudo para no final estarem num lado e escaparem ao outro.

O encadeamento de jogos num contexto competitivo, com subidas e descidas de divisão, é algo que nunca vi falhar num treino. Aqui a proposta de 3 jogos reduzidos distintos, cada um a pedir respostas diferentes aos jogadores e a requer constante adaptação ao novo contexto quando trocam de campo. Para além de ninguém querer ficar no último campo pelas consequências, o jogo de GR+4x4+GR, mais apelativo para os jogadores, vai servir como recompensa às equipas que lá chegarem.
O encadeamento de jogos num contexto competitivo, com subidas e descidas de divisão, é algo que nunca vi falhar num treino. Aqui a proposta de 3 jogos reduzidos distintos, cada um a pedir respostas diferentes aos jogadores e a requer constante adaptação ao novo contexto quando trocam de campo. Para além de ninguém querer ficar no último campo pelas consequências, o jogo de GR+4x4+GR, mais apelativo para os jogadores, vai servir como recompensa às equipas que lá chegarem.

A competitividade de um exercício tem, porém, uma segunda faceta. A adversidade adequada do próprio exercício aos jogadores. Um exercício demasiado fácil torna-se aborrecido para os jogadores porque não se tem de empenhar para ter sucesso e não representa minimamente a exigência da competição. Um exercício demasiado difícil é desmotivante porque são poucas, ou nenhumas, as vezes que os jogadores têm sucesso durante o mesmo.

Um bom exercício é aquele que representa uma montanha difícil de escalar, mas ao alcance dos nossos jogadores. E isso os jogadores tem de senti-lo com o decorrer do exercício ou então temos de ser nós a mostrar, e convencer, do porquê de sabermos que aquele desafio está no limiar das suas capacidades e é ali que eles terão de dar o passo seguinte na sua evolução.

Todo o exercício que é competitivo hoje, pode continuar a sê-lo amanha, e depois, mas com o número de vezes que aparece nos nossos treinos aumentam a chances de o deixar de ser. Os nossos jogadores vão dominar todas as suas entradas e saídas com o tempo e deixar de evoluir com ele. Quando isto acontece o exercício "morre" como diz Vítor Pereira. Quanto melhor forem os exercícios mais deles temos de cuidar retirando-os, e introduzindo-os, nos treinos ao ritmo das respostas dos nossos jogadores.

O grande desafio para os treinadores

Quando identificamos as características de um bom exercício o passo seguinte passa por evoluirmos o nosso processo de criação dos mesmos tentando conciliar o melhor possível estas variáveis. Esta evolução pode ser atacada por dois lados:

  1. Criar uma checklist com as características que valorizarmos e a cada exercício que desenharmos damos uma classificação segundo cada critério. Isto tem um condão de não nos esquecermos de nenhum ponto importante e podermos aferir a nossa evolução no processo.
  2. Fazer uma retrospetiva aos exercícios que desenhamos no passado e classificar cada um com o critério em que está mais forte, e no que está mais fraco. O objetivo é detetarmos algum padrão que se revele e onde tenhamos de apostar mais em melhorar. Por exemplo: se a maioria dos nossos exercícios tiver como pior critério a falta de competitividade, então devemos daí para a frente dedicarmos mais tempo a melhorar esse aspeto nos exercícios que formos criando.

O desafio seguinte passa por tentar conciliar características que muitas vezes parecem opostas, ao melhorarmos numa, estamos a piorar noutra. Talvez o exemplo mais saliente seja o de lidar com a simplicidade e autossuficiência no mesmo exercício. É que numa visão superficial, para o exercício ser simples terá que viver muito do que o treinador vá acrescentando(guiando) pelo feedback, enquanto para estimular comportamentos e não precisar de tanto feedback, então tem de ter mais regras que condicionem ações. É claro que a qualidade da equipa técnica vai fazer a diferença na resolução deste dilema, se é que ele chega a existir, mas independentemente do nosso nível, acredito que seja já um passo em frente se considerarmos esta dualidade à partida.

No meu caso, por personalidade, tenho muito mais tendência a observar e analisar do que intervir. Isso leva-me a dar muito mais peso a criar exercícios que possam conduzir os jogadores a chegar a respostas sem qualquer intervenção minha. E reconheço também que a simplicidade do exercício sofre normalmente com isso. Após esta reflexão, estou mais sensibilizado para equilibrar a balança e dar muito mais valor à simplicidade do exercício. Pensar sobretudo em quem o vai jogar, e que não vai ter um papel com diagramas para ajudar.